Ódio Patológico?! De quem?! A Saga das Mortes nos Comandos

O título sugere dois apontamentos: um de natureza comunicacional e outro judicial.

Primeiro apontamento.
Reiterando opiniões já veiculadas anteriormente, não são aceitáveis mortes em instrução. As ocorrências têm de ser investigadas à exaustão e as responsabilidades apuradas, com as devidas consequências.
Seguramente que um apuramento sério da verdade não pode ser feito através do festim mediático que se instaurou, condenando pessoas e instituições respeitáveis na praça pública com meias verdades. Por exemplo, insistir na mentira de que o médico mandou os instruendos rastejar até à ambulância. Falso. Falso mas muitas pessoas acreditam que é verdade; ou dizer que “só é Comando há apenas dois anos. Apesar da pouca experiência foi promovido a instrutor”. Só quem desconhece a instituição militar pode asneirar desta maneira. Isto não é informação; é manipulação da opinião pública. Assemelha-se às operações psicológicas, em que se mistura verdade com mentira para se atingirem os resultados pretendidos.
Alguns órgãos da comunicação social encontraram na morte dos dois instruendos do curso de Comandos um filão, explorando miseravelmente o infortúnio de quem morreu. Move-os a “share” e não o sofrimento dos familiares (que exploram à exaustão), ou o apuramento da verdade.
Convém relembrar que os chefes da redações deixaram de ser representantes dos jornalistas, para passarem a ser dos acionistas. Isso explica, pelo menos parcialmente, as evoluções negativas registadas nos últimos tempos na qualidade informativa, exemplificada pela tortuosa repetição de notícias "não notícias"; o “encher chouriços” com banalidades sem valor em nome do direito a informar, etc. Fomos confrontados esta semana com a cena patética de um repórter a “informar” diretamente do Comando de Forças Terrestres (CFT), em Oeiras. Desconhecia que o CFT tinha mudado para a Amadora há uns meses, e as instalações que nos apresentava como o local onde os militares tinham sido detidos encontram-se agora desocupadas. É esta gente que se arvora da verdade e do rigor.
A centralidade do processo informativo passou da informação para o apresentador. O que está é em causa é o “show off” dos pivots transformados em vedetas. Em vez de informação temos espetáculo! é a vitória do arrivismo! Só pode ser gozação chamar-lhe jornalismo de investigação.

O segundo apontamento.
Fomos surpreendidos na última 5.ª feira com a inédita detenção de sete instrutores do curso de Comandos pela Polícia Judiciária Militar, na sequência de mandados de detenção emitidos pela procuradora do Ministério Público Cândida Vilar. Segundo o despacho, face aos indícios da prática dos crimes de abuso de autoridade por ofensa à integridade física, à personalidade dos suspeitos movidos por ódio patológico, irracional contra os instruendos, que consideram inferiores por ainda não fazerem parte do grupo de Comandos, o DIAP de Lisboa entendeu que havia perigos de continuação da atividade criminosa e de perturbação do inquérito.
Depois de toda mediatização provocada pela linguagem hostil e agressiva do despacho, o juiz de instrução decretou que os arguidos saíssem todos em liberdade, com termo de identidade e residência. A medida mais gravosa foi aplicada ao capitão médico. Foi suspenso de exercer funções médicas (apenas) em unidade militares, podendo continuar a exercer a prática clínica no SNS ou privadamente. A montanha pariu um rato.
Haveria necessidade de tanto escândalo e humilhação dos militares (e consequentemente da Instituição Militar) provocando a sua aparatosa detenção para depois irem todos em liberdade e ficarem sujeitos à medida de coação menos gravosa? Desde logo, a sensata decisão do juiz de instrução “tirou o tapete” à procuradora, deixando passar a ideia que houve um erro de avaliação (sem o fazer explicitamente).
O comportamento da procuradora foi de uma gravidade extrema. Explicaremos porquê.
1. A detenção com base no perigo de continuação da atividade criminosa e de perturbação do inquérito é, no mínimo, desajustada e infeliz. Os militares foram detidos quando faltavam cinco dias para terminar o curso, já na chamada fase operacional em que a continuação da alegada atividade criminosa era muito remota. Falar em perturbação do inquérito mais de dois meses e meio após as mortes, por parte de pessoas que convivem diariamente é um argumento tão insensato que nem merece comentário. A Sr.ª procuradora devia ter feito mais trabalho de casa. 
2. O texto do despacho da procuradora está envaido de preconceito. Em vez de provas temos apreciações subjetivas. E raiva. Há algo que não bate certo com o senso comum. Não é sério fazer juízos de valor de natureza psicológica sobre arguidos que nunca ouviu, com quem nunca falou.
3. Os termos usados no despacho são de uma agressividade gratuita e não estabelecem uma relação de causa / efeito para as mortes. Resumem-se a interpretações extrajudiciais, opiniões, sem relação com factos. Falta-lhes a objetividade exigida ao exercício da justiça. A sr.ª procuradora pode fazer aqueles comentários no café, no intervalo de uma dentada no pastel de nata; nunca num documento oficial.
4. Ódio patológico é uma doença. Tem de ser tratado, não punido. Pessoas com problemas patológicos do foro psiquiátrico são inimputáveis. Ou será que estou a ver mal?
5. A procuradora meteu no mesmo saco “Comandos”, um corpo de tropas respeitável que muito tem dado ao país, com o gangue do multibanco, os “skinheads” ou os “No Name boys”, aquilo com que estava habituada a lidar, antes de ter sido afastada de funções. Parece não ter ainda percebido que já não presta serviço na secção de criminalidade violenta, do DIAP.
6. Tendo o  DIAP uma secção (a 10.ª) que trata apenas da investigação de crimes militares, não se percebe (se calhar até se percebe) a nomeação de uma pessoa desconhecedora das especificidades do funcionamento da Instituição militar para investigar este caso. 

Para já, a procuradora perdeu a primeira batalha. Não conseguiu a prisão preventiva dos arguidos, o seu objetivo imediato. Tudo indicava que as palavras utilizadas no despacho visavam obter do juiz medidas de coação mais duras, nomeadamente a prisão preventiva, apesar de os seus pressupostos não se encontrarem configurados. Era óbvio para qualquer observador isento, o que parece não ser o caso em apreço.
O despacho da Sr.ª procuradora revela que não se encontra à altura do desafio que o Ministério Público lhe entregou. Falta-lhe imparcialidade e lucidez. Move-a algo estranho e indecifrável. O bom sendo aconselha-me a não ir mais longe em comentários sobre perfis e estados psicológicos. Resta-me, contudo, uma dúvida “existencialista”. Quem é que afinal tem ódios patológicos?

Post Scriptum

1. Porque é que o programa “Sexta às 9” entrevistou o diretor de saúde militar das Forças Armadas em vez de entrevistar o diretor do Hospital das Forças Armadas (HFAR)? Teria sido seguramente muito mais esclarecedor.
2. O médico afirmou que abandonou o posto de trabalho para preparar a receção dos militares acidentados no HFAR. Porquê? É estranho. Mais tarde ou mais cedo, alguém terá de esclarecer o que aconteceu para que o médico não tivesse conseguido evacuar os dois doentes pelo canal sanitário militar. Estou convicto que em sede própria será encontrada resposta para esta questão.
3. O diretor de saúde das Forças Armadas afirmou que a urgência do hospital está sempre preparada. Posso arranjar dezenas de pessoas disponíveis para testemunhar o contrário. Começando pelo meu próprio caso. Seria interessante fazer um questionário sobre o nível de satisfação dos utentes do HFAR. Sobre a alegada preparação do serviço de urgências, seria fundamental, por exemplo, esclarecer se a capacidade de hemodiálise instalada na unidade de cuidados intensivos é compatível com as necessidades.
4. Ficou-me uma dúvida. Qual é afinal o canal de evacuação sanitário? O INEM?


Comentários

Morais Silva disse…
No meio de erros, omissões e confusões várias pergunto-me porquê o oficial general que dá voz de prisão aos seus subordinaods, não os mantém consigo ( o perigo de fuga estava resolvido) e não comunica essa sua decisão à senhora procuradora. Perante a indignidade exigem-se tomadas de posição firmes e esclarecedoras. Como se pode consentir o enxovalho do Exército e a sua exposição ao voyeurismo das catatuas das televisões sem protesto e oposição?
Outros tempos em que se desconhece o que António Vieira ensinava: "Nós somos o que fazemos. O que não se faz não existe. Portanto só existimos no dia em que fazemos. Nos dias em que não fazemos apenas duramos"
Com amizade
Morais Silva
Coronel
Morais Silva disse…
No meio de erros, omissões e confusões várias pergunto-me porquê o oficial general que dá voz de prisão aos seus subordinaods, não os mantém consigo ( o perigo de fuga estava resolvido) e não comunica essa sua decisão à senhora procuradora. Perante a indignidade exigem-se tomadas de posição firmes e esclarecedoras. Como se pode consentir o enxovalho do Exército e a sua exposição ao voyeurismo das catatuas das televisões sem protesto e oposição?
Outros tempos em que se desconhece o que António Vieira ensinava: "Nós somos o que fazemos. O que não se faz não existe. Portanto só existimos no dia em que fazemos. Nos dias em que não fazemos apenas duramos"
Com amizade
Morais Silva
Coronel
Manel do Montado disse…
Tem toda a razão meu General. Uma simples guia de marcha a cada um dos militares resolvia o problema da detenção. Mas a agenda política de alguns deputados da nação falou mais alto. Quanto à digníssima procuradora não temos comentários, pois julgo que o Conselho Superior do MP estará atento.
Vitor disse…
A procuradora da Republica dizia (há uns anos) no despacho de pronúncia que os arguidos (skinheads) acusados de discriminação racial são "Movidos por ódio patológico, irracional contra as minorias étnicas" (Ver in: https://www.publico.pt/destaque/jornal/skinheads-sao-acusados-de-tentar-lancar-guerra-racial-256291)
Também, recentemente, sete militares arguidos detidos foram presentes à juíza de instrução para primeiro interrogatório judicial, a fim de lhe serem aplicadas medidas de coação mais gravosas que o TIR, porque os “suspeitos (eram) movidos por ódio patológico, irracional contra os instruendos, que consideram inferiores …”.
Estão agora os Comandos e a Instituição militar, porque estes adjetivos podem ser considerados aplicados a todos quantos dão instrução militar, aos olhos de alguns, ao nível de um gang de malfeitores que destila ódio sobre todos os outros, considerando-os inferiores.
Isto nem mereceria qualquer resposta ou que lhe fosse dada relevância se não fosse o caso de quem o “afirmar” ter a responsabilidade de investigação criminal e demonstrar nesta complexos graves contra a Instituição militar. Diria mesmo, manifestar um ódio patológico e irracional contra as Forças Armadas, o que distorcerá qualquer capacidade para investigação dos factos objeto da investigação.
Mas parece que afinal alguém pretenderia isso mesmo. Gostaria de perceber porque é que factos considerados com crimes estritamente militares estão a ser investigados por uma procuradora expressamente nomeada para o efeito, retirando a tutela desta investigação à secção do DIAP (a 10.ª) quem compete investigar TODOS os crimes de natureza militar.

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