O Ministro da Defesa e a (falta de) Ética. A República das Bananas travestida de Estado de Direito.
A história que vos vou contar
prende-se com a recente nomeação do novo Diretor-Geral de Política de Defesa
Nacional (DGPDN) pelo Ministro da Defesa Nacional (MDN). Verão que vale a pena ler a história até ao
fim. Não darão o tempo por perdido.
O agora nomeado exercia as
funções de DGPDN em regime de substituição havia cerca de quatro anos, quando a
lei (Estatuto do Pessoal Dirigente, Lei n.º 2/2004) prevê apenas um período de
90 dias, entre o início do exercício de funções em regime de substituição e a
abertura do concurso (em linguagem da CRESAP procedimento concursal).
Um primeiro concurso para o
cargo de DGPDN teve lugar em dezembro de 2013. O incumbente não estava na lista
curta. A lista curta não foi publicada e o concurso foi cancelado.
No estertor do governo PSD, foi
aberto novo concurso (julho de 2015). Como nessa altura a probabilidade da
nomeação vir a ser feita por um governo PS, o incumbente, provavelmente para
não ser humilhado, não concorreu ao cargo. Após a tomada de posse dos ministros
do novo governo do PS, Azeredo Lopes anulou o concurso aberto pelo seu
antecessor.
E não se sabe - se por amizade, conhecimento pessoal, desempenho de
funções, coabitação do incumbente e do novo MDN na ERC, ou por mérito – o novo
MDN abriu novo procedimento concursal passado quase um ano após a anulação
promovida pelo próprio. Note-se, o terceiro concurso com a particularidade de o
incumbente possuir, então à data da abertura do terceiro concurso, quatro anos
de desempenho da função sem o crivo do concurso.
Estava o incumbente longe de
pensar que o futuro MDN de um governo PS iria ser um grande amigo seu. Não lhe
bastava a proteção de Aguiar-Branco (de quem já tinha sido adjunto no
ministério da justiça), o novo MDN era o seu “ex-colega” na ERC e seu
orientador de doutoramento (entre outras afinidades).
Estava-se mesmo a ver qual
seria o desfecho final. Estava tudo preparado. A CRESAP estava de mãos e pés
atados. Seria muito difícil não incluir o incumbente na lista curta, após ter
desempenhado a função por quatro anos (Na verdade, até nem seria difícil
excluí-lo se tivesse feito uma avaliação do seu desempenho. Quando três
colaboradores diretos (diretores de serviço) do incumbente renunciaram aos
cargos devido ao comportamento do chefe é porque o problema não estará nos
colaboradores).
Aliás, este é o truque recorrentemente utilizado para aparentar, fingir
que as nomeações são honestas e limpinhas. Coloca-se o amigo numa função
durante pelo menos um ano/ano e meio (violando a lei) para ganhar curriculum e
depois abre-se concurso. A CRESAP não tem muitas hipóteses de não colocar os
amigos dos ministros nas listas curtas. Da
lista curta à nomeação a distância é a prerrogativa do ministro escolher entre
os três nomes que lhe são apresentados.
Este truque tem sido a norma em
vez da exceção. Com este golpe lança-se areia para os olhos da populaça
dizendo-lhes que agora com a CRESAP as nomeações para os cargos de direção da
função pública são feitas com base no mérito. O mínimo que se pode dizer é que
os poderes públicos andam impunemente a gozar com o sistema. Nestas condições, parece
fazer sentido dispensar os serviços da CRESAP. Poupava-se dinheiro e não se
chamava estúpido a ninguém. Todos ganhávamos. Seria mais transparente.
Depois de dois concursos
cancelados e quatro anos na função em regime de substituição, o incumbente é
finalmente legalmente nomeado para uma comissão de cinco anos com “base no mérito”.
Aliás, estas manigâncias são norma no MDN. Já do antecedente tinha sido nomeado
para Diretor-Geral de Recursos uma pessoa que por inerência do cargo é também
diretor nacional de armamento (matéria com a qual nunca teve contacto na vida)
e que tem que representar Portugal em instâncias internacionais, nomeadamente
na NATO, onde a língua de trabalho é o inglês, a qual ele não domina tendo, por
isso, de se fazer representar.
O atual MDN faz parte de um
grupo de intelectuais (tanto de esquerda como de direita) que, por motivos
diferentes, abomina militares e as forças armadas. E que não o consegue
disfarçar. Volta não volta estala-lhe o verniz. O seu comportamento durante a
“crise” no Colégio Militar que culminou com a demissão do Chefe do Exército
ilustra bem o que digo. Não é de estranhar o número de entrevistas que têm sido
ensaiadas para melhorar a má imagem que deixou na gestão daquela crise.
Temos alguma dificuldade em inserir o MDN no
grupo da esquerda ou da direita. Antes de ser MDN, pelo seu passado e pelas
afirmações públicas que fez (recorda-se o seu artigo de 28 setembro com o
título as “Sondagens Assassinas” em que zombava da esquerda dizendo que não
existe e que tinha morrido de morte morrida matada), diria que seria de direita
(ou centro-direita), agora que é MDN alterou o discurso cantando loas ao
arranjo governativo a que aderiu. Parece estar do lado que mais jeito der. É
uma questão de vento. Isto tem um nome.
O MDN referiu pública e
reiteradas vezes que militares e diplomatas não podiam exercer a função de
DGPDN devido aos seus interesses corporativos. Os militares não podiam, mas o
seu amigo, de quem é orientando e colega de cadeira na Universidade Católica do Porto,
sem qualificações para o cargo já podia, porque era amigo. É sobejamente
conhecido pelos seus colaboradores o desconhecimento profundo do agora nomeado
nas diferentes áreas de atividade da DGPDN (cooperação técnico-militar,
planeamento militar, relações internacionais de defesa). Ser amigo tornou-se
condição maior da meritocracia.
Um dos requisitos para o cargo
era ter experiência em organizações internacionais. O protegido do MDN tinha
tido há 17 anos uma presença fugaz de 6 meses na UNTAET (na função de Defensor
Público, no Painel Especial para os Crimes Graves do Tribunal Distrital de
Díli, sem qualquer relação com a função de DGPDN), em oposição a outros
candidatos com dez anos de experiência em organizações internacionais, tanto ao
nível tático como estratégico, em matérias diretamente relacionadas com as
funções para que concorreram.
Em vez de dizer para quem o
queria ouvir que não ia nomear militares e diplomatas para o cargo, podia ter
tido a coragem de escrever esse “requisito” na carta de missão. Como devemos
apelidar este comportamento?
Pagava para ouvir o ministro dos
negócios estrangeiros dizer que os diplomatas não podiam ocupar cargos de
direção no ministério dos negócios estrangeiros; ou o ministro da saúde a dizer
que médicos não podiam ocupar cargos de direção no ministério da saúde; ou o
ministro da justiça a dizer o mesmo relativamente aos magistrados. Dispenso-me
de comentar.
Será que para o MDN controlo
democrático das forças armadas é atribuir à socapa e no corredor um estatuto de
menoridade e de cidadãos de segunda classe aos militares? excluir militares da
nomeação para cargos de direção no MDN (sem ter tido a coragem de o escrever na
carta de missão) é, entre outras coisas, mais uma demonstração da falta de
consideração que nutre pelos militares e pelas forças armadas.
O cancelamento de um concurso
para o qual o seu protegido não tinha concorrido, para o reabrir passados
alguns meses, dando-lhe a possibilidade de concorrer para o nomear, sugere a possibilidade de favorecimento, a
qual deveria ser investigada pelo ministério público para esclarecer a suspeita
que paira no ar. Isto quanto à
legalidade do ato.
É por comportamentos desta natureza
que os cidadãos acreditam cada vez menos na democracia e se afastam da
política. É tempo de se fazer algo para que este tipo de práticas seja
irradiada e os seus perpetradores não se sintam impunes. Esperava-se maior
elevação ética de pessoas com as responsabilidades do MDN.
Não pense o MDN que estes atos
antidemocráticos irão ser esquecidos. Um dia deixará de exercer funções
ministeriais, mas as Forças Armadas vão continuar a existir.
PS: contrariando o espírito da
Constituição, os processos individuais dos candidatos não podem ser consultados,
escapando ao escrutínio, facilitando declarações menos exatas; o esquema foi
montado de modo a não poder haver impugnação dos atos nem efeitos suspensivos;
não podem haver contestações às decisões com base na urgência das mesmas.
Depois de quatro anos a violar a lei, o argumento que preside ao impedimento da
impugnação das decisões é a urgência. Prevalece a arbitrariedade. Isto não pode
ser levado a sério. O Estado de Direito foi tomado de assalto.
Comentários
PROGNÓSTICOS E SONDAGENS
O ex-nº 2 do FC Porto celebrizou a máxima de que "prognósticos só no fim do jogo". O ex-chefe de gabinete do presidente da CM Porto, com base nas sondagens da altura, também se destacou com previsões na "mouche". Uma semana antes das últimas eleições legislativas teve esta excelente participação nos media, com o título "As Sondagens Assassinas" - 28Set2015, 08:25 J. A. Azeredo Lopes, em que termina com o seguinte comentário: "A maior e mais notável lição que se retirará destas eleições é que pela última vez será intelectualmente legítimo falar na votação da esquerda. A esquerda não existe (se calhar, nunca existiu) como conceito unitário em Portugal, essa esquerda morreu de morte morrida matada. E é hoje, isso sim, um notável, fascinante, incongruente saco de gatos."
PROGNÓSTICOS E SONDAGENS
O ex-nº 2 do Porto celebrizou a máxima de que "prognósticos só no fim do jogo". O ex-chefe de gabinete do presidente da CM Porto, com base nas sondagens da altura, também se destacou com previsões na "mouche". Uma semana antes das últimas eleições legislativas teve esta excelente participação nos media, com o título "As Sondagens Assassinas" - 28Set2015, 08:25 J. A. Azeredo Lopes, em que termina com o seguinte comentário: "A maior e mais notável lição que se retirará destas eleições é que pela última vez será intelectualmente legítimo falar na votação da esquerda. A esquerda não existe (se calhar, nunca existiu) como conceito unitário em Portugal, essa esquerda morreu de morte morrida matada. E é hoje, isso sim, um notável, fascinante, incongruente saco de gatos."
É uma lufada de ar fresco confrontar-nos com a frontalidade e seriedade de afirmações como aquelas que produz, relativamente ao ministro (letra minúscula intencional), continuador de todas as malfeitorias praticadas pelo seu antecessor, com práticas que o caracterizaram como exímio desconstrutor das Forças Armadas de Portugal! Até no que concerne à questão concreta tratada no artigo lhe seguiu o exemplo; é ver o que se passa com a vogal que, passados mais de dois anos, ilegalmente se mantém em regime de substituição, quando, como muito bem diz, a sua permanência dependeria de processo concursal passados que fossem 90 dias...
Efectivamente, mais parece estarmos numa República das bananas, travestida de Estado de Direito, em que impunidade parece ser a regra.
16 de Dezembro de 2016
É uma lufada de ar fresco confrontar-nos com a frontalidade e seriedade de afirmações como aquelas que produz, relativamente ao ministro (letra minúscula intencional), continuador de todas as malfeitorias praticadas pelo seu antecessor, com práticas que o caracterizaram como exímio desconstrutor das Forças Armadas de Portugal! Até no que concerne à questão concreta tratada no artigo lhe seguiu o exemplo; é ver o que se passa com a vogal que, passados mais de dois anos, ilegalmente se mantém em regime de substituição, quando, como muito bem diz, a sua permanência dependeria de processo concursal passados que fossem 90 dias...
Efectivamente, mais parece estarmos numa República das bananas, travestida de Estado de Direito, em que impunidade parece ser a regra.
16 de Dezembro de 2016
Há muito que não estamos num estado de direito, melhor, formalmente estamos, na prática está a poucos centímetros de república de bananas.
O caso que aponta é um de muitos. Nas autarquias que conheço bem (4) as pouca-vergonhas são frequentes. As denúncias não têm efeito nenhum. É sempre interessante ouvir certos DDT no âmbito da justiça, como ouvi ontem na televisão a propósito de um recentíssimo caso mediático, com o ar mais cândido deste mundo - "....é ilegal, não se justifica, ....é uma pessoa séria...."
Estamos rodeados de pessoas que....não se riem!!
António Cabral, cAlmirante, reformado (Chapéus há muitos)
Muito bem analisado e expresso.
Conheci de perto o incumbente, trabalhei com ele e para ele, um profundo desconhecedor de tudo o que seja Defesa e pouco permeável a explicações, uma perfeita marioneta para o MDN usar a seu belo prazer.
Um boy do sistema, muito promotor da sua imagem, sempre a cultivar o seu umbigo.
É uma pena que pessoas competentes como o Senhor e como outras que trabalham na DGPDN e que poderiam também preencher o lugar de forma competente, sejam postos de lado por aldrabices do sistema implementado pela CRESAP.
Só espero que se mantenha firme nesta denuncia e que a leva às mais altas esfera dos media.